quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

O Correio Braziliense de Hipólito da Costa

1. Introdução:
O atual “Correio Braziliense” é descendente direto do histórico “Correio Braziliense” ou “Armazém Literário” editado em Londres, a partir de 1808, por Hipólito José da Costa.
Apesar de ter sido editado na Inglaterra, o Correio Braziliense de Hipólito da Costa pode ser considerado o primeiro jornal brasileiro, fazendo parte do primeiro momento jornalístico no Brasil – o nascimento da imprensa nacional.

Lançado em 1808, o periódico mensal circulou de 01/06/1808 a 01/12/1822, num total de 175 números, editados durante 14 anos e sete meses publicados sempre no primeiro dia de cada mês.

O jornal recebeu o nome de Correio Braziliense porque, na época, ainda não existia um termo apropriado para os nascidos no país – até então se chamavam brasileiros aos portugueses que negociavam com o Brasil e brasilianos aos índios. Como explica Isabel Lustosa: “Brazilienses eram os portugueses nascidos ou estabelecidos no Brasil e que se sentiam vinculados ao país como à sua verdadeira pátria”. Assim, Hipólito deixava claro que sua mensagem era destinada aos leitores do Brasil.



2. Hipólito da Costa:
Hipólito da Costa nasceu em 1764, na colônia de Sacramento no sul do Brasil – região que, posteriormente, veio a fazer parte do Uruguai. De família rica e prestigiosa, passa a infância no sul, antigo Rio Grande. Ainda jovem, parte para Portugal, para estudar em Coimbra. De lá, em 1798, enviado em missão do governo português, passa dois anos nos Estados Unidos.
Nos EUA, Hipólito conhece uma ex-colônia com instituições políticas, sociais e culturais avançadas, que desfrutava dos benefícios de uma imprensa livre. Em comparação, Brasil e Portugal pareciam atrasados, com seu regime absolutista e vivendo ainda sob o jugo da Inquisição. Na América, conhece a maçonaria[1], um evento que lhe custaria caro no seu retorno a Portugal.

De volta a Portugal, ele assume o cargo de funcionário da Imprensa Régia. Em paralelo, se envolve intensamente com as atividades da nascente maçonaria portuguesa. Há de se lembrar, no entanto, que Portugal ainda vivia sob o peso da Inquisição, onde outras manifestações religiosas eram severamente reprimidas.

Hipólito é preso, e passa três anos encarcerado. Nesse período, o Santo Ofício ainda era extremamente poderoso, e a única forma de ser liberto, era fugir. Hipólito segue, então, para Londres, onde tinha poderosas conexões, e onde a maçonaria era largamente aceita.



3. O NASCIMENTO DO JORNAL:
3.1 Contexto:

Em 1808, fugindo da invasão francesa a Portugal, D. João VI e toda a Corte portuguesa chegam ao Brasil. Até a invasão dos exércitos de Bonaparte, Portugal tentava equilibras as pressões francesas e inglesas – os gauleses queriam que os lusos rompessem com os ingleses e estes, por sua vez, pressionavam para que Portugal continuasse sob sua influência.

Por fim, Portugal aceita a proteção inglesa e em 27 de novembro de 1807, a Corte parte para o Brasil. Dois dias depois, França invade Portugal. A instalação de um rei da metrópole em sua colônia de exploração era novidade, e estimulou uma efervescência política e cultural do país, o que estimulou Hipólito, por sua vez, a vislumbrar possibilidades de progresso para o Brasil.

Estimulado pela sua experiência na Inglaterra, onde a monarquia constitucional era fato, onde havia um Parlamento eficiente, que de fato limitava o poder do rei, e onde a imprensa era livre, em 1 de junho de 1808, nasce o primeiro jornal brasileiro.

Nele, Hipólito fazia oposição a Portugal, pregava avanços como a Constituição e a substituição gradativa do trabalho escravo e a liberdade de imprensa. Na época, a circulação de jornais era proibida no país, e o Correio vinha contrabandeado em navios.



4. O JORNAL:
No Correio, Hipólito fazia uma espécie de clipping de gazetas de outros países. Daí também a importância do jornal para o Brasil – era ele a principal fonte de noticias para o país.

4.1 Seções:
O Correio Braziliense era dividido em quatro segmentos:
a) Política:
Era a seção de maior destaque no jornal. Trazia a transcrição de documentos oficiais sobre negócios nacionais e estrangeiros.

b) Comércio e Artes:
Trazia publicações sobre acordos comerciais nacionais e estrangeiros. Hipólito da Costa sempre demonstrou grande interesse por assuntos de economia política.

c) Literatura e Ciências:
Seção dedicada a informações de novas publicações sobre os temas na Inglaterra e Portugal. Por vezes, publicava transcrições de obras científicas ou literárias na Inglaterra e Portugal, acompanhadas de resenhas do próprio.

d) Ciências e Miscelânea:
Como próprio título da seção aponta, era dedicada a assuntos diversos, novidades do Brasil e Portugal e temas polêmicos. Continha duas subseções:

· Reflexões sobre as novidades do mês: opinião do editor sobre os principais acontecimentos ocorridos no Brasil ou em Portugal. Apesar desta seção ser dedicada exclusivamente às impressões de Hipólito, isso não quer dizer que no resto do jornal ele buscasse imparcialidade. A publicação inteira era permeada por seus comentários.

Mas foi nessa seção, por exemplo, que Hipólito explicitou de forma clara e organizada seus projetos e sonhos para o Brasil. Por isso, esse é um importante arquivo para a história da imprensa brasileira, bem como do país.

e) Correspondência: similar a atual seção “Cartas dos Leitores”.
Essa seção não era fixa no jornal. Algumas edições a continham, outras não.

4.2 O formato:
· Média do número de páginas por edição: 70 a 140.
· Maior número de páginas: 236 (edição n 51, agosto/1812)
· Menor número de páginas: 48 (No 175, dezembro/1822)
· Subtítulo do jornal: “Armazém Literário”
· Diagramação: as páginas não eram divididas em colunas. O formato era o mesmo de um livro. Por vezes, eram publicados artigos que se prolongavam por várias edições.
· Patrocínio: ainda não existiam os anúncios de jornal.








5. O CORREIO BRAZILIENSE DE HIPÓLITO:
5.1 Um jornal político:
Em oposição aos grandes jornais de hoje em dia, o Correio Braziliense era extremamente político e parcial. Em seu jornal, Hipólito da Costa defendia ideias progressistas, que iam contra o posicionamento da Coroa portuguesa no Brasil.
O Correio Braziliense defendia ideias liberais como a de uma monarquia constitucional e o fim da escravidão no Brasil. Pode-se questionar que impacto efetivo teria um jornal progressista editado em Londres, mas deve-se levar em consideração que, na época, o Brasil era colônia de Portugal e, portanto, um periódico como esse não poderia existir dentro do país.
Hipólito fazia o esforço para assegurar que o veículo chegasse ao Brasil, ainda que clandestinamente. Apesar dos empecilhos para chegar aos leitores, o jornal e suas constantes críticas a Portugal tinham impacto, e chegavam ao país contrabandeados em navios comerciais.

5.2 Coberturas importantes:
a) A trajetória de Napoleão Bonaparte:
Alem da publicação de artigos e documentos oficiais, o Correio Braziliense trazia ma coletânea das noticias dos grandes jornais ingleses. Terminou, assim, por ser, a maior conexão do Brasil com as informações do resto do mundo. Foi através do Correio que os brasileiros acompanharam a trajetória de Napoleao, até sua derrota em Waterloo e se exílio em Santa Elena.

b) Independência das colônias espanholas na América
A cobertura a que os leitores do jornal tiveram acesso era privilegiada. Hipólito mantinha relações como Miranda, Bolívar e San Martin, dos quais obtinha informações sobre o processo de independência.

6. O FINAL DO CORREIO DE HIPÓLITO:
Em 1820, eclode a Revolução Constitucionalista do Porto, seguindo a tendência iluminista observada em outros países europeus. Fato é que os portugueses estavam extremamente descontentes com a instalação do reinado no Brasil, e com o fim do monopólio comercial – a partir da abertura dos portos brasileiros.

Mas a insatisfação dos portugueses ia além dos prejuízos comerciais. Com a transferência de instituições importantes no Brasil a partir da instalação do reinado, Portugal se sentiu desprestigiado, como se o papel tivesse se invertido, e fosse ela a colônia.

A Revolução eclodiu em Porto e se espalho pelo país. Uma junta de revolucionários assume o poder de fato, e lançou a base do que viria a ser a Constituição do país e convocou uma assembléia constituinte. Essa determina a volta de D. João VI a Portugal, que acontece em 26 de abril de 1821.

O Correio Braziliense acompanhou toda a Revolução do Porto com grande entusiasmo, inclusive pela promessa de instauração de leis no Brasil. Mas, quando se começam a votar as leis sem mesmo a presença de deputados brasileiros, Hipólito se mostra menos entusiasmado, previsão que se confirma pelo teor colonialista da Corte para com o Brasil.

Durante esse processo surgem os primeiros jornais de fato brasileiros – isto é, editados no país. Hipólito manteve um bom diálogo com o surgimento da imprensa livre no Brasil, fato que sado efusivamente.

O desgosto do Brasil com a retirada do reino, e o desprestigio de se ver tratada novamente como colônia, foi pelo poder de articulação que a circulação de ma impressa livre traz, acabam por culminar na independência do país, em 1822.

O Correio Braziliense de Hipólito pára de circular após a independência do Brasil, em 1823. Hipólito e seu Correio ainda colaboraram em um esforço pelo reconhecimento da independência do Brasil na Europa. Mas, a partir da instauração de uma imprensa livre no país, Hipólito julga deixar de fazer sentido editar um jornal brasileiro no exterior, uma vez que circula uma imprensa livre dentro do próprio país.

[1] Associação religiosa ritual fundada no século XVI, na Inglaterra, que prega princípios de liberdade e igualdade.

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